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REGIÃO | Bloco leva ao parlamento proposta com medidas para prevenir e erradicar situações de violência obstétrica nos Açores

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O Bloco de Esquerda vai levar ao parlamento dos Açores uma proposta com recomendações para prevenir e combater a existência de situações de violência obstétrica nos hospitais da Região. Vera Pires, deputada do Bloco de Esquerda, salientou que o testemunho de muitas mulheres e homens confirma que este tipo de violência é uma realidade nos Açores, mas faltam elementos para a caracterizar e quantificar.

É precisamente por aí que o Bloco de Esquerda pretende começar: “É preciso conhecer com detalhe o panorama da gravidez, parto e pós-parto nos Açores para o melhorar. É preciso reconhecer a existência da violência obstétrica para a erradicar. É preciso formar e informar para garantir o respeito pelos direitos das mulheres”, disse a deputada Vera Pires, no encerramento do debate público sobre violência obstétrica promovido pelo Bloco de Esquerda hoje em Ponta Delgada.

Da proposta apresentada consta a realização de um estudo regional anónimo sobre práticas de violência obstétrica, a realização de campanhas de sensibilização para a prevenção e combate à violência obstétrica e a promoção da literacia em saúde materna e obstétrica.

Além disso, o Bloco de Esquerda quer que passe a haver o registo obrigatório, por parte dos hospitais da região, dos procedimentos realizados no parto, incluindo episiotomias e outras práticas adotadas, assim como a respetiva justificação da sua realização.

Isto porque, na resposta do Governo Regional a um requerimento do Bloco de Esquerda, ficou a saber-se, por exemplo, que não existe registo e divulgação por parte dos hospitais dos Açores em relação a procedimentos como episiotomias e manobras de Kristeller – práticas não recomendadas pela Organização Mundial de Saúde.

“Estas exigências levarão a uma mais ampla consciencialização dos profissionais de saúde envolvidos no que diz respeito a práticas de rotina e práticas de exceção, e vão também permitir fazer um retrato mais documentado de como se nasce nos Açores”, disse Vera Pires.

“A prática de atos médicos sem consentimento informado, situações de abuso psicológico e verbal, a negação de acompanhamento ou de respeito pelas escolhas da mulher no momento do parto são situações que existem, mas que queremos ver desaparecer”, acrescentou.

O Bloco pretende também que os hospitais da região passem a adotar planos de parto institucionais, adequados à sua realidade, e que se realizem inquéritos de satisfação às puérperas sobre a sua experiência de parto.

A deputada do Bloco lembrou que “a segunda edição do inquérito ‘Experiências de Parto em Portugal’, que contou com a participação de 81 mulheres açorianas, concluiu que três em cada dez inquiridas afirmam ter sido vítimas de abuso, desrespeito ou discriminação, sendo as intervenções não consentidas as apontadas como a forma mais recorrente dessa violência”.

Catarina Barata, membro da Direção da Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto, oradora convidada, referiu um outro estudo, em que uma percentagem significativa das 58 mulheres açorianas que participaram referem situações de falta de informação, de falta de consentimento, ou de falta de apoio no parto, por exemplo.

À resposta do Governo Regional ao requerimento do Bloco, onde é referido que não há queixas de violência obstétrica nos Açores, Catarina Barata contrapôs com os resultados deste estudo.

A discrepância entre as queixas formais e as respostas das mulheres açorianas nestes estudos pode ser explicada porque as mulheres “sentem um grande descrédito no sistema”, explicou Catarina Barata.

A oradora salienta que apesar do facto de falar sobre violência obstétrica ser muitas vezes entendido “como um ataque aos profissionais de saúde, não é disso que se trata”, e explica que, frequentemente, é o próprio contexto hospitalar, a hierarquia ou a falta de condições do próprio estabelecimento de saúde que contribuem para estas situações.

Outra oradora convidada foi Catarina Pires, psicóloga clínica, que salientou a importância da comunicação entre os profissionais de saúde e a grávida e a atenção às suas necessidades emocionais durante o parto – e não apenas físicas – porque isso pode ter um grande impacto na forma como o parto decorre e também na sua perceção sobre o mesmo.

A psicóloga alertou para o elevado número de cesarianas nos Açores, cuja percentagem está bastante acima do que é recomendado pela Organização Mundial de Saúde.

Márcio Tavares, enfermeiro especialista em saúde materna e obstetrícia, orador convidado, referiu que um dos fatores para a existência deste elevado número de cesarianas é a reduzida quantidade de médicos obstetras e de enfermeiros obstetras nos hospitais dos Açores, por isso, defende que é necessários formar e contratar mais profissionais especialistas nesta área.

No encerramento do evento, a deputada do Bloco, Vera Pires, concluiu que é necessário ter mais dados concretos sobre o fenómeno da violência obstétrica nos Açores, e ao mesmo tempo, é necessário também dar trabalhar no sentido de haver reconhecimento público da existência destas situações de violência, assim como um trabalho aturado para a sua prevenção e combate.

É neste sentido que vai a proposta que o Bloco vai entregar no parlamento.

BE/AÇORES/RÁDIOILHÉU

Mauricio De Jesus
Maurício de Jesus é o Diretor de Programação da Rádio Ilhéu, sediada na Ilha de São Jorge. É também autor da rubrica 'Cronicas da Ilha e de Um Ilhéu' que é emitida em rádios locais, regionais e da diáspora desde 2015.