OPINIÃO | Onésimo Teotónio Almeida: um paladino da açorianidade e da portugalidade, por Daniel Bastos
No ocaso do mês abril, o professor catedrático no Departamento de Estudos Portugueses e Brasileiros da Universidade de Brown, Onésimo Teotónio Almeida, uma das figuras mais proeminentes da numerosa comunidade luso-americana, lecionou a sua última aula numa das academias mais prestigiadas dos Estados Unidos da América (EUA).
Com um percurso académico brilhante, o ilustre açoriano nasceu no Pico da Pedra, no interior da costa norte da Ilha de São Miguel em 1946. Tendo estudado no Seminário de Angra do Heroísmo, e depois de se licenciar na Universidade Católica de Lisboa, emigrou para os EUA em 1972, para estudar Filosofia, pátria de acolhimento onde realizou nessa área o mestrado e doutoramento na Universidade de Brown.
No decurso das últimas décadas fundou, dirigiu e dinamizou o Departamento de Estudos Portugueses e Brasileiros da instituição de ensino superior que o acolheu, lecionando cursos interdisciplinares sobre valores e história cultural e das ideias, como por exemplo, História Cultural e Intelectual de Portugal e Valores e Mundivisões.
Enquanto académico, mas também na qualidade de investigador e escritor com vários livros de ensaios, e centenas de artigos dispersos ou reunidos em volumes temáticos, Onésimo Teotónio Almeida tem-se debruçado profusamente sobre a relação entre os Estados Unidos e a comunidade luso-americana. Uma comunidade que ronda mais de um milhão de portugueses e luso-americanos, maioritariamente emigrantes açorianos e seus descendentes, que se destaca hoje pela sua perfeita integração, inegável empreendedorismo e relevante papel económico e sociopolítico na principal potência mundial.
Uma comunidade que no início dos anos 80, em New Bedford, cidade localizada no estado de Massachusetts, foi posta em xeque pela opinião pública norte-americana no seguimento do caso de Cheryl Araújo, uma luso-americana que foi violada no bar Big Dan”s, por quatro portugueses. A defesa acérrima do filósofo açoriano nessa época da comunidade portuguesa foi decisiva para aplacar a tentação de justiça na praça pública norte-americana, que começava a sentar toda a diáspora lusa no banco dos réus, confundindo a árvore com a floresta.
Na missão, dedicação e propósito do escritor e professor, a portugalidade tem assumido indubitavelmente um papel central. Assim expressa em 1994, o seu livro de crónicas Que Nome é Esse, Ó Nézimo?, que inclui o capítulo “Da Portugalidade Como Doença”. E as suas obras, Português Sem Filtro (2011) e A Obsessão da Portugalidade (2017), onde as temáticas ligadas à língua, cultura e identidade, resultantes do seu contacto estreito com as comunidades lusas dos EUA e do Canadá, são eixos de análise e dissecação dos meandros identitários portugueses.
Nunca olvidando as suas raízes arquipelágicas, o cosmopolitismo e a portugalidade dissecada pelo olhar profundo e engajado de Onésimo Teotónio Almeida, que em 2018 foi designado pelo Presidente da República para presidir às comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, estende-se também aos fundamentos da identidade açoriana e às suas formas de expressão.
Na esteira do insigne escritor e professor açoriano Vitorino Nemésio, autor no segundo quartel do séc. XX do termo açorianidade, Onésimo Teotónio Almeida na missão, dedicação e propósito do seu percurso pessoal e académico tem-se debruçado intensamente sobre a condição histórica, geográfica, social e humana do ser açoriano.
Assim, se apreende no livro Minima Azorica. O meu mundo é deste reino, que reúne os principais textos açóricos escritos pelo professor catedrático da Universidade de Brown ao longo de vinte anos (1994- 2014). Mais do que uma obra, um verdadeiro desígnio da sua vida, onde o mesmo assume, que mais “do que um lugar “de onde”, os Açores foram-me sempre um lugar “onde”. Costumo dizer que não emigrei, só alarguei fronteiras, tanto para oriente como para ocidente. Por isso as margens do Atlântico se me aproximaram e fizeram um rio. A ida para Lisboa e, poucos anos depois, para os EUA, fez-me dar conta de um generalizado desconhecimento do meu arquipélago, mesmo de realidades tão simples como a sua geografia. Vicissitudes diversas levaram-me a embrenhar-me no estudo da cultura açoriana e, de modo especial, da sua produção literária”.Ilustre académico com uma brilhante carreira, vasta produção e vários prémios, a trajetória de vida Onésimo Teotónio Almeida, genuíno paladino da açorianidade e da portugalidade, e reconhecido pelo sentido notável de humor e humildade, a mãe de todas as virtudes. Escora o retrato justamente traçado pelo Presidente da República aquando da entrega em 2018 do Prémio D. Diniz ao escritor natural dos Açores: “Por ser um português na América, Onésimo pode escrever sem nacionalismos nem masoquismos. Digamos que tem atuado como um lusitanista iluminado sem que essa iluminação signifique aqui sentido de medida, cautelas quanto a grandes eloquências, ceticismo em relação ao politicamente correto tão em voga na universidade americana”.