No dia em que o País tinha os olhos postos na convocatória de Fernando Santos para o mundial do Qatar – cuja escolha, só por si, é um erro descomunal das instituições que deveriam honrar a herança humanista, moderna e liberal – acordamos com a informação de que os projetos de revisão constitucional do PS e PSD são convergentes em matéria de supressão de direitos, redução das liberdades e regressão do nível de garantias. Salvo erro, foi Benjamin Franklin que disse: “Those who would give up essential Liberty, to purchase a little temporary Safety, deserve neither Liberty nor Safety” (“Aqueles que abrirem mão da Liberdade essencial, para comprar um pouco de Segurança temporária, não merecem nem Liberdade nem Segurança”). Frase acertada e avisada. É verdade!
Ainda a semana passada, escrevia, num jornal local, sobre a liberdade e as liberdades, mal sabendo que vinham por aí projetos de revisão constitucional de conveniência (se bem que, confesso, tinha uma certa desconfiança que isso pudesse acontecer, considerando os atropelos que esta “gentalha” cometeu durante a primeira fase da pandemia e sem estado de emergência declarado). O estado de emergência configura aquilo que, em direito, se qualifica como “estado de exceção”, ou seja, é um momento que, por absoluta emergência do estado, excecional e temporariamente, se suprimem direitos e garantias constitucionais. É, por isso, que o estado de emergência apenas pode ser declarado pelo Presidente da República, com autorização da Assembleia da República, dois órgãos eleitos por sufrágio direto, universal e secreto, o que lhe confere uma legitimidade democrática ímpar. No passado ainda recente e por várias vezes, o Tribunal Constitucional, que é quem fiscaliza o cumprimento da nossa lei fundamental, confirmou atropelos ao texto de valor reforçado por via de medidas tomadas pelo Governo do País, fora dos períodos em que esteve em vigor o tal estado de exceção. E, não sobram muitas dúvidas, que aos governantes que não cumprem os preceitos constitucionais e que atropelam os direitos, liberdades e garantias, impondo leis ilegais ao seu povo, chamam-se tiranos.
Vêm agora os partidos do grande centrão, a “reboque” da casuística, propor alterações à Constituição. Um regime que altera, de corrida e por conveniência, o seu texto fundamental tem um nome e não é Estado de Direito Democrático e Liberal, é algo muito grave, algo assustadoramente grave, que se chama ditadura.
O custo social, político e até económico que toda a humanidade está a pagar pelas tomadas de posição absurdas e medrosas dos seus governos são o caminho para os totalitarismos e para a desresponsabilização do indivíduo. Os governos estão-nos a fazer pagar um custo enorme por decisões que não tomamos, nas quais não fomos ouvidos, nem achados. Robert Heinlein, um escritor norte-americano de ficção científica e um dos mais interessantes pensadores sobre a liberdade do século XX americano, terá dito um dia: “There is no worse tyranny than to force a man to pay for what he does not want merely because you think it would be good for him” (“Não há tirania pior do que forçar um homem a pagar pelo que ele não quer, apenas porque se acha que seria bom para ele”).
Afinal, os inimigos da liberdade estão por aí, em cada esquina, e não são aqueles de onde se esperavam esse tipo de ensaio de tirania. Os grandes inimigos das liberdades estão no socialismo, seja ele o mais radical do PCP e/ou do Bloco de Esquerda, seja ele moderado e da “terceira via” como no PS e/ou no PSD.
O processo de revisão constitucional agora aberto não augura nada de bom. Em primeiro lugar por ser extemporâneo, já que se discute, nas Regiões Autónomas, em especial nos Açores, o aprofundamento do projeto Autonómico Constitucional, estando para isso a decorrer uma comissão especializada da Assembleia Legislativa da Região para terminar o trabalho começado na Legislatura anterior pela famigerada CEVERA. É também extemporâneo por não trazer debate sobre uma reforma profunda das instituições, o que, isso sim, é de relevante importância para o País.
E não! Rever direitos, liberdades e garantias não é urgente, nem necessário, neste momento, nem é admissível em momento algum.
Haja saúde!
Artigo de Opinião do Deputado na ALRAA, pela Iniciativa Liberal, Nuno Barata.