OPINIÃO | Cultura Açoriana na Califórnia: Partilha e Celebração como Pilares de Identidade, por Diniz Borges
A cultura açoriana pode e deve ocupar um lugar significativo na paisagem multicultural da Califórnia, enriquecendo o estado com as suas tradições, história, literatura, jornalismo e arte. A comunidade açoriana na Califórnia tem desempenhado um papel vital na formação do tecido cultural deste estado. É tempo de sairmos do nosso mundo fechado, e por vezes demasiado simplificado, e promovermos um sentido de diversidade e inclusão que reflicta a rica tapeçaria da sociedade californiana.
Um dos estados mais multiculturais do mundo norte-americano para o qual os açorianos têm contribuído. A cultura açoriana na Califórnia relembra-nos, particularmente numa era em que os movimentos mais nativistas e reacionários estão em moda, as raízes profundas que este estado possui na imigração e na diversidade. A diáspora açoriana, tal como muitas outras diásporas na Califórnia, representa uma história de resiliência, adaptação e perseverança face aos desafios de um mundo em evolução constante. Ao celebrarmos e preservarmos a açorianidade na Califórnia, com olhos postos no futuro, contribuímos para a identidade multicultural do estado e ajudamos a promover um sentido de unidade entre a diversificação deste estado.
A cultura açoriana, a diversidade da mesma, particularmente se quisermos utilizar a nova criatividade açoriana no arquipélago, traz um rico património, não só de tradições e costumes, mas também uma riqueza literária, musical e artística, em todo o conceito abrangente da mesma, que acrescenta profundidade e diversidade à multiculturalidade deste estado. Desde a nova criatividade musical até às artes plásticas; desde a literatura em tradução até ao papel dos Açores no mundo americano fora das suas fronteiras; desde as artes cénicas até às produções televisivas de qualidade, a cultura açoriana oferece um conjunto único e vibrante de experiências que contribuem para o mosaico cultural deste progressista e único estado. Preservar e disseminar a açorianidade na Califórnia serve como uma ponte entre o passado e o presente, mostrando a resiliência e a adaptabilidade de uma comunidade que superou reptos e prosperou num novo ambiente. Ao preservarmos, e tão, ou mais importante, partilharmos a nossa história, a nossa tradição literária e artística, e ensinarmos a nossa língua no mundo americano, os californianos de origem açoriana honram os seus antepassados e educam os outros sobre a rica tapeçaria da sua herança cultural, que tem um legado artístico impressionante.
Num mundo multicultural, como é a Califórnia, as culturas étnicas desempenham um papel crucial na formação da vibrante colgadura da diversidade que caracteriza, este estado e de uma forma generalista todas as sociedades multiculturais através deste planeta. Embora algumas culturas étnicas possam ser inicialmente consideradas como estando fora da corrente dominante (a nossa tem sido uma dessas) há várias formas de as integrar e de as celebrar como parte da paisagem cultural mais alargada, do mosaico que é este colossal estado. O tecido cultural composto por muitas fibras que define quem somos como californianos. Não é segredo para ninguém que uma das formas em que as culturas étnicas se tornam parte das correntes dominantes, que compõem a sociedade, é através da educação e da consciencialização. As escolas, as organizações comunitárias e as instituições culturais são fundamentais na promoção da compreensão e apreciação das diferentes tradições, histórias, literaturas e criatividades étnicas. Ao incorporar diversas perspectivas nos currículos; ao organizar eventos culturais; ao fornecer recursos para se aprender sobre várias culturas, a sociedade californiana promove um sentido de inclusão e respeito por todas as origens culturais. Nós, no mundo açoriano da Califórnia, temos de fazer parte desse sistema. Não podemos ficar à margem, felizes com o sucesso da comunidade, sem a mesma ter influência no mundo que nos rodeia e do qual somos parte integrante, mesmo os mais reticentes.
Os meios de comunicação social, e a indústria do entretenimento, têm uma influência significativa na formação da cultura dominante. Daí a importância de estarmos presentes. As diversas histórias, personagens e vozes étnicas, ajudam a normalizar e a celebrar as culturas étnicas. As novas gerações, e as gerações mais distantes dos Açores por laços familiares (foram os avós ou bisavós que emigraram) não querem viver num mundo que esteja na periferia cultural. Quando as pessoas, de todas as idades e gerações, se vêem refletidas nos meios de comunicação do mundo que os rodeia, cria-se um sentimento de pertença e orgulho na sua herança cultural. Os principais meios de comunicação social da Califórnia, podem ajudar a derrubar estereótipos e ideias erradas sobre diferentes grupos étnicos, incluindo o nosso, promovendo a empatia e a compreensão entre o público. Os meios de comunicação dedicados à comunidade também terão de mudar, porque estão a fazer comunicação social para a comunidade que éramos na viagem do século. A comunidade que já não somos.
A cultura açoriana na Califórnia pode ser uma força congregadora que fomente um espírito de colaboração e compreensão mútua entre diferentes grupos culturais, promovendo o diálogo, o intercâmbio e a cooperação que construam pontes e derrube fronteiras, estimulando um sentido de unidade na diversidade. Ao envolvermo-nos com outras comunidades e ao partilharmos as nossas tradições e experiências, os californianos de origem açoriana contribuem para um panorama multicultural mais inclusivo e harmonioso. Levando a arte, a música, a literatura e a nossa história, a do arquipélago e a da diáspora, junto do “mainstream”, a açorianidade na Califórnia enriquece a diversidade cultural deste estado. Contribuímos com novas perspectivas, ideias e modos de vida que alargam os horizontes e desafiam os pressupostos.
Através de eventos culturais, abertos a todas as etnias, programas educativos no mundo escolar e académico deste estado, e iniciativas que sejam amplificadas a todos os residentes, não só promovemos a compreensão e a apreciação interculturais, como teremos cada vez mais uma presença ativa na criação de uma sociedade mais interligada e empática. Na realidade não precisamos mais uma festa, precisamos sim, de mais restaurantes que sirvam a riqueza da nossa gastronomia; mais escolas e universidades com cursos de língua portuguesa, onde esteja a especificidade da cultura açoriana; mais organizações que utilizem os seus espaços e os seus eventos para irem além da simples reprodução de um tempo que já não é; de mais literatura e história traduzida e ao alcance de quem a quiser comprar, ler e aprender; de uma nova presença das artes plásticas no mundo das exposições e das galerias deste estado. Enfim, de tudo o que se tem dito e apelado para que a açorianidade neste estado não fique circunscrita ao que, por ser popular, é, na maioria dos casos, de pouca qualidade.
Não nos esqueçamos que a cultura açoriana pode e deve servir de ponte entre a Califórnia e o mundo lusófono em geral. Como parte da diáspora lusófona, os açorianos e açor-descendentes na Califórnia mantêm fortes laços com o seu país de origem, ou país dos seus pais, Portugal, e com outros países do mundo lusófono, onde alguns emigraram antes de se aventurarem para a Califórnia, ou têm laços familiares, promovendo o intercâmbio cultural e a colaboração além-fronteiras. Esta ligação não só enriquece a paisagem cultural deste estado, como também abre oportunidades de diálogo, comércio e cooperação a uma escala global.
Como se sabe, as relações interpessoais e os esforços internos desempenham um papel crucial na integração das culturas étnicas nas mais variadas sociedades. É imperativo que se estabeleçam novos contactos, que se fomentem outras amizades e que se participe em intercâmbios interculturais com indivíduos de diferentes origens para que se derrubem barreiras e se promova a compreensão mútua. A participação em eventos culturais, o voluntariado em comunidades diversas e o diálogo aberto entre a nossa diáspora e os nossos vizinhos e amigos de outras etnias, permitem criaram-se espaços onde as mais variadas culturas, incluindo a nossa, possam ser acolhidas e celebradas como parte integrante da sociedade.
Numa contemporaneidade cada vez mais interligada, e num estado que desde sempre tem sido um mundo de vários mundos, as culturas étnicas na Califórnia têm o potencial de enriquecer e estimular o panorama cultural dominante através da educação, da representação nos meios de comunicação social, da capacitação económica, do apoio governamental e de iniciativas de base em cada comunidade que se misturem e criem parcerias com todas as etnias. Ao valorizar e celebrar a diversidade, a sociedade californiana cria um ambiente mais inclusivo e vibrante, em que todas as origens culturais são respeitadas e apreciadas. Abraçar as culturas étnicas como parte integrante da corrente dominante não só aumenta a riqueza do nosso património cultural comum, como também promove um sentimento de unidade e de pertença entre todos os membros da sociedade. Daí que a cultura açoriana não pode ficar à margem, nem tão pouco adotar o slogan Salazarista: orgulhosamente sós.
Se quisermos trabalhar em conjunto, olhando além do nosso umbigo e das nossas manias pessoais, podemos construir uma presença cultural açoriana que desempenhe um papel vital no multiculturalismo da Califórnia, enriquecendo o estado com os nossos verdadeiros valores culturais.
Ao celebrarmos e preservarmos o nosso património, fomentamos as ligações com outras comunidades e promovendo o diálogo e a colaboração, os a açorianidade na Califórnia contribuirá para uma sociedade mais vibrante, inclusiva e harmoniosa que valorize a diversidade e abrace a riqueza do intercâmbio cultural. Temos todos os ingredientes para fortalecermos a identidade cultural dos nossos filhos e netos, e promovermos um genuíno sentimento de pertença, assegurando que as gerações futuras possam continuar a abraçar as suas raízes açorianas, em sintonia com todas as outras culturas e etnias que constituem o seu mundo. Não percamos mais tempo.