A banda desenhada, um género literário em franco crescimento que assenta numa sequência de imagens (desenhadas e/ou pintadas) que narram uma história, podendo incluir ou não texto (legendas, diálogos ou pensamentos), começa cada vez mais a direcionar através dos seus autores e protagonistas, a sua atenção para a temática da emigração portuguesa.
O exemplo mais recente ocorreu no ocaso do mês de junho, na Casa-Museu Frederico de Freitas, na pérola do Atlântico, onde foi apresentada a publicação Da Madeira Para o Hawaii. Trata-se de um livro original, em banda desenhada, com conteúdos digitais em formato de realidade aumentada, que visa assim sensibilizar e divulgar junto dos mais jovens os temas da emigração, do Atlântico e da história da Madeira, estimulando a criação contemporânea e o trabalho dos jovens autores.
Esta encomenda da Secretaria Regional de Turismo e Cultura no âmbito do projeto Interreg Espaço Atlântico TIDE, tem o condão de revisitar a epopeia da emigração portuguesa para o Havai. Mormente, o pioneirismo da chegada no termo do séc. XIX, de madeirenses ao Havai, um dos cinquenta estados norte-americanos, localizado em pleno Oceano Pacifico, cuja capital e maior cidade é Honolulu.
No ano passado, chegou aos escaparates das livrarias francesas o livro Les Portugais, assinado pelo artista plástico lusodescendente Olivier Afonso, e que conta em banda desenhada a odisseia dos portugueses nos anos 70 em França. Nomeadamente, a história da emigração clandestina composta por passadores, a antiga realidade dos bidonvilles e a incessante procura de melhores condições de vida, eixos assertivamente explorados na obra por este filho de emigrantes lusos vindos de Monção e Felgueiras, e que nasceu e cresceu nos arredores de Paris no decurso da década de 1970.
Na mesma esteira, cinco anos antes tinha sido lançado no território gaulês, pelo autor francês Robin Walter, a banda desenhada Maria e Salazar, que retrata a história da emigração portuguesa para França. O livro biográfico e autobiográfico, editado no ano seguinte em português, foi desenvolvido a partir do contacto com Maria, uma emigrante lusa que chegou a Paris em 1972, e que trabalhou como empregada doméstica na casa dos pais de Robin Walter durante 30 anos.
Esta história franco-portuguesa tinha sido já no começo da década de 2010 abordada pelo desenhador francês lusodescendente, Cyril Pedrosa, no livro de banda desenhada Portugal. Misturando a ficção com alguns elementos autobiográficos, o autor nascido em 1972, em Poitiers, oriundo de uma família da Figueira da Foz que emigrou nos anos 30 para França, retrata em Portugal a história de um lusodescendente francês sem contacto com o país dos seus antepassados e que resolve tentar saber mais sobre as suas origens.
Nesse período, e no âmbito da sua participação no Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora, um dos cinco maiores eventos de quadrinhos da Europa, Cyril Pedrosa precisou que aborda no livro “um Portugal imaginário, quer dizer, aquele que eu conheço e que não é o verdadeiro Portugal. É um Portugal emocional, o das sensações e da afeição que tenho por esse país, por esse povo, por essa língua. Sei perfeitamente que não conheço a realidade do país, para isso teria que viver nele. Mas conheço a beleza da sua língua, a generosidade dos portugueses”.
Como salienta António Jorge Pereira da Silva de Almeida Serra, na dissertação A utilização da Banda Desenhada no ensino da História e Geografia de Portugal, ao “longo das últimas décadas a BD tem vindo a amadurecer, abrangendo uma
grande diversidade de públicos, desde crianças a adultos”, contribuindo deste modo, no caso concreto da emigração lusa, para um melhor conhecimento da história desse fluxo profundamente presente na memória e identidade da sociedade portuguesa.
DB/RÁDIOILHÉU