Quando me convidaram para contribuir para “16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra as Mulheres”, vieram-me, de forma imediata, à cabeça os seguintes versos: “Por causa de dançar nas ruas/Por causa de todas as vezes que tínhamos medo de beijar os nossos amantes/Por causa do constrangimento de um bolso vazio/Por causa do anseio por uma vida normal”.
Esta é a canção que marca a mais recente revolta feminina, por via da forma como as meninas, jovens e mulheres, são, no século XXI, tratadas, no Irão.
Uma letra comovente, construída através das palavras reproduzidas por mulheres que se veem privadas dos mais básicos dos Direitos Humanos. No entanto, e face ao regime iraniano, o seu cantautor foi detido por dar voz aos sentimentos que geraram a revolta generalizada e os maiores protestos contra o governo, que começaram com o enterro de Mahsa Amini, de 22 anos.
Mahsa Amini morreu por não ter colocado corretamente o véu com que a obrigavam a cobrir a cabeça. Morreu à mercê de socos e pontapés, morreu às mãos de leis patriarcais, feitas por homens e para benefício dos mesmos. Morreu por que a “polícia da Moral” detetou que não cobria uns fios de cabelo.
Rapidamente, os iranianos saíram às ruas, em todas as cidades, contra uma série de injustiças que sofrem, como a pobreza, a repressão, a segregação de género e a violação dos direitos humanos.
São milhares de mulheres, no Irão, que estão nas ruas, unindo as suas vozes e as suas mãos, pelos seus direitos, para que termine a ideia generalizada de que nada são. Mulheres e meninas iranianas caminham em direção às milícias do regime sem hijab (véu) e sem medo. E, mesmo, havendo imagens de uma violência extrema, espancamentos ao pontapé e à bastonada, e mortas ao volante dos seus carros com um disparo na cabeça, nada as demove deste grito, que deixou de ser mudo para se tornar audível, de forma a chegar ao Ocidente a revolta que acontece no Irão.
Esta luta que começou com a retirada do hijab, já se tornou mais abrangente e, neste momento, outras regras impostas são já contrariadas. Nas redes sociais, onde mais facilmente se tem acompanhado esta revolta feminina, podemos constatar imagens de mulheres iranianas mostrando metade do seu rosto, olhos pintados, longas pestanas arranjadas, brincos, sem hijab, sozinhas a caminhar na direção de um membro da temível milícia Bassij e adolescentes a caminhar em cima de um viaduto na cidade de Shiraz arrancando a página com a fotografia do Guia Supremo dos seus livros da escola, que vão lançando ao vento, enquanto encorajam quem com elas se cruza a juntar-se aos protestos.
Outras mulheres correm atrás dos mulás (clérigos islâmicos), tirando-lhes os turbantes, mostrando-lhes o seu quotidiano. Para perceberem a insegurança que sentem. Mas, na verdade, para que os homens experienciassem a vida de uma mulher iraniana teriam de ser detidos, humilhados e agredidos pela “Polícia da Moral”, que lhes mostraria que o código da indumentária não estava a ser cumprido.
“Mulher, vida, liberdade”, palavras ecoadas por mulheres e jovens iranianas, com toda a determinação por um amanhã diferente! Por um amanhã sem medo de ser mulher!